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Inovação verde

Posted by Administradores - FCA on domingo, novembro 14, 2010 in

Até hoje, nenhum país conseguiu enriquecer e manter sua riqueza natural. O Brasil também tem fracassado.
O sonho se transformou em realidade. O Brasil virou uma grande potência agroindustrial, o país que mais pode contribuir para suprir a crescente demanda mundial por alimentos, bicombustíveis e produtos químicos renováveis. Inovação e empreendedorismo foram os ingredientes do sucesso. Enquanto centros de pesquisa inovavam, agricultores transformavam inovação em riqueza. A agricultura migrou do Paraná para o cerrado, a pinga se transformou em etanol, que, transformado em polietileno, pode ser encontrado nas embalagens de refrigerantes. O Brasil se tornou grande exportador de soja, açúcar, carne e suco de laranja — e muitos outros produtos se somarão à lista. Mas o sucesso não esconde os problemas a ser enfrentados. O maior será equilibrar crescimento econômico e preservação do meio ambiente. Que fração do cerrado cobriremos com soja? Quantas hidrelétricas serão construídas na Amazônia? Quantos portos pipocarão ao longo da costa? Seremos capazes de conciliar o justo anseio de prosperidade com a necessária preservação dos ecossistemas?
Talvez o desafio mais agudo seja regular a expansão da agropecuária. Até hoje nenhuma sociedade foi capaz de conciliar a expansão de uma agricultura competitiva com a preservação ambiental. Na Europa, grande parte das florestas originais foi destruída. Na América do Norte, quase toda a área agricultável já é explorada. A biodiversidade dessas regiões foi destruída num período em que ninguém pensava em políticas de preservação. O dilema e o ônus moral de conciliar conservação e produção de alimentos foram relegados a países capazes de produzir alimentos de forma competitiva. Europeus e americanos não lidam com o problema de ter uma Amazônia pressionada por uma fronteira agrícola em constante movimento. Mas nós temos. Nossa agricultura está se expandindo durante o período histórico em que o homem descobriu a necessidade de preservar o meio ambiente.
Na procura do equilíbrio, teremos de abandonar duas visões igualmente radicais. A primeira é a que nega o problema ambiental, por preconceito ou esperteza. Muitos defendem, abertamente ou não, que a questão da preservação é secundária diante da oportunidade de progresso gerada pela crescente demanda internacional por nossos produtos. O meio ambiente, nessa lógica, pode esperar. No polo radical oposto, temos a defesa romântica da natureza, buscando um passado que não existe mais.
Talvez o melhor exemplo dessa tensão seja a atual discussão em torno do Código Florestal, legislação que regula a expansão agropecuária. A lei é um dos pilares da preservação dos ecossistemas terrestres, pois regulamenta a fração e a localização da vegetação nativa que pode ser removida e substituída
pela agropecuária. Regula a ocupação do território, excluindo apenas parques nacionais, reservas indígenas e outras áreas protegidas. A versão original, de 1965, foi alterada diversas vezes. Uma nova versão está no Congresso e deve ser votada nos próximos meses.
Alguns ambientalistas tentam preservar a versão atual, que jamais foi cumprida, provocou o acúmulo de um enorme passivo ambiental e, pior, não protegeu a vegetação nativa ao longo das últimas quatro décadas. Parte do setor agroindustrial apoia o substitutivo que, na sua forma atual, tornará precária a possibilidade de preservação da vegetação nativa. Vale a pena entender um pouco as entranhas da lei.
Hora de decidir
Se a lei atual não tem conseguido equilibrar crescimento e preservação, a proposta ora em discussão no Congresso, de autoria do deputado Aldo Rebelo, também tem problemas, como a permissão de desmate para pequenas propriedades e a suspensão das autuações e multas por cinco anos. Ambas incentivam o desmatamento. Por outro lado, o substitutivo contém algumas boas ideias. A principal é o conceito de compensação. Rebelo quer permitir que os défi cits de reserva legal sejam compensados por meio da proteção de áreas nativas distantes da propriedade original. Um proprietário que tenha acumulado um déficit de 100 hectares em sua propriedade poderia comprar ou alugar 100 hectares de florestas nativas e registrar esse bloco como sendo a reserva legal de sua propriedade. A área não seria derrubada, mas poderia ser transmitida entre propriedades produtivas, criando um mercado para áreas com vegetação nativa. Imagine a consequência dessa medida na Mata Atlântica. Para cobrir o déficit de 9 milhões de hectares de reservas legais, as propriedades produtivas teriam a obrigação de comprar ou alugar o correspondente entre os 29 milhões de áreas com vegetação natural que ainda existem fora das reservas e terras indígenas. As propriedades agrícolas seriam responsáveis pela manutenção dessas matas para sempre. O resultado seria a transferência de 9 milhões de hectares do conjunto de áreas passíveis de desmate para o pool de áreas preservadas permanentemente.
O exemplo das discussões em torno do Código Florestal ilustra bem as tensões que o próximo presidente terá de enfrentar. O Brasil tem gerado muita riqueza explorando seus recursos naturais. Estamos crescendo mais aceleradamente, e isso é ótimo para milhões de brasileiros. Mas ainda não chegamos a um consenso sobre como e quanto preservar para garantir a sustentabilidade do desenvolvimento. O Brasil tem tudo para chegar lá — mas a hora de decidir como fazer isso é agora.

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